Angelina Jolie e o BRCA1 e 2 – o que fazer?

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Em 2014, como descrevo aqui, fiz o exame genético para ver se tinha os genes do câncer de mama (e ovário), BRCA1 e BRCA2. O mesmo gene que a Angelina Jolie tem e a fez tomar medidas como as que temos ouvido na midia desde 2015. Fiz o exame porque o meu subtipo molecular de câncer de mama foi um Triplo Negativo (só acontece em 10% dos casos de câncer de mama). O Triplo Negativo é um tumor mais agressivo, tende a crescer mais rapidamente (o que explica o seu aparecimento em um mês), tem mais probabilidades de dar metástases (aparecer em outros órgãos), tem maior chance de voltar a aparecer (recidiva) e não existem tratamentos específicos, além de uma quimioterapia agressiva (e radioterapia).

De qualquer forma o meu exame genético deu negativo (ufa) e assim não precisei ser radical e mudei apenas o meu estilo de vida e faço os meus exames trimestrais.

Já a Angelina Jolie, símbolo mundial da feminilidade, que nunca teve um câncer mas tem um histórico na familia (perdeu a mãe com cerca de 50 anos), decidiu fazer o exame genético para poder ter uma atitude proativa caso tivesse o gene. Ela tem vários filhos e quer estar “aqui” para cuidar deles ao invés de ter a possibilidade de os fazer sofrer, como ela sofreu com a mãe. E o resultado foi positivo para o BRCA1 e BRCA2. Além disso, o resultado genético ditou que a chance dela ter um câncer de mama era de 85% e de ter um câncer de ovário era de 55%. Posto isto, a mãe de familia, submeteu-se a uma série de cirurgias em que numa primeira fase retirou as mamas (mastectomia preventiva) e depois retirou as trompas e os ovários (salpingo-ooforectomia bilateral).

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O que é o gene BRCA? Você também se deveria preocupar com isso?

Para nos esclarecer melhor sobre este assunto, convidei o Dr. Gilberto Amorim*, Oncologista Clínico da Oncologia D’Or, para responder a algumas perguntinhas e ele logo se prontificou.

Quem deve fazer este exame genético?

Cerca de 90% dos casos de câncer de mama e 85-90% dos casos de Câncer de ovário ocorrem sem nenhuma relação com estes genes. Mesmo em pacientes com alguma história familiar (10% dos casos). Ou seja, muito se fala sobre a “carga genética” mas a maioria dos casos de câncer de mama são “esporádicos” e não tem indicação de teste genético.

O teste da mutação deve ser lembrado para pacientes:

  • com forte historia familiar (especialmente de parentes de 1º grau como mãe e/ou avó e/ou irmã da mãe, com câncer de mama ou ovário);
  • pacientes de câncer de mama com menos de 50 anos e que tenham o tipo do tumor “triplo negativo” (negativo para os hormônios femininos e para o HER2);
  • quando o caso de câncer de mama é bilateral (nas 2 mamas);
  • ou naquelas raras mulheres filhas de homens que tiveram ca de mama.

O teste é caro, deve ser bem pensado pela paciente em conjunto com o mastologista e oncologista e, sempre que possível, indicado pelo geneticista, uma vez que a partir de 01/2014 a ANS estabeleceu critérios para a cobertura do teste pelas operadoras de planos de saúde. Infelizmente no SUS (75% da população brasileira) o teste não está disponível e, com raríssimas exceções, é realizado em instituições de pesquisa. (VEJA AQUI COMO FAZER, DE GRAÇA, PELO CONVÊNIO)

De qualquer forma, antes de fazer o exame, mesmo que preencha algum dos critérios acima, a paciente tem que estar segura e saber quais são as opções caso o resultado for positivo. Se não é melhor nem fazer e ir fazendo exames trimestrais ou semestrais (orientados pelo médico).

E se o resultado for positivo, o que fazer?

  1. Cirurgias radicais preventivas (Angelina Jolie):
    1. Mastectomia bilateral preventiva (retirar as duas mamas) – A redução do risco é de 90%, ou seja, risco não cai a zero, até por ser impossível retirar 100% da glândula mamária pois a pele e do mamilo precisam respirar.
    2. Retirada das trompas e Ovários – reduz o risco em mais de 98% e, em geral, está indicada por volta dos 40 anos, em mulheres já com filhos (exatamente o caso da Angelina).
  2. Fazer um anti-hormónio, como Tamoxifeno – reduz o risco em cerca de 50%. Mulheres que já passaram a menopausa podem usar Exemestane que reduz em 60% o risco.
  3. Retirada dos ovários sem a cirurgia da mama, que também reduz o risco de câncer de mama a metade (e claro reduz o risco do próprio câncer de ovário em quase 100%).

É preciso fazer um acompanhamento de perto, com exames de mamografia e ultrassonografia (por volta de 35 anos) e também ressonância magnética em conjunto ou de 6 em 6 meses. Para o diagnóstico precoce do câncer de ovário (difícil, é verdade), recomenda-se ultrassom transvaginal e o exame de sangue Ca125 a cada 6 meses.

É uma decisão difícil e arrojada, as cirurgia radicais trazem consequências, existem complicações imediatas e tardias. Muitas mulheres têm cicatrizes nas mamas com dores crônicas e resultado estético insatisfatório. Há perda total na sensibilidade, algumas mulheres referem problemas na auto-estima e no contato íntimo após o procedimento das mamas (30% dos casos). E no caso da cirurgia da retirada dos ovários o maior desafio é a menopausa precoce (ondas de calor, queda de libido, irritabilidade, ganho de peso e outras queixas que podem ser atenuadas com dieta equilibrada, exercícios físicos, fitoterápicos, acupuntura, e em casos selecionados reposição hormonal) mas é claro que como bem disse a Angelina ela não deixou de ser mulher e não se sente menos feminina por isso. É uma atitude muito corajosa, não só pelo ato em si, mas por compartilhar com o mundo todo esta decisão. Trazer novamente o assunto à tona é muito importante.

E como ela mesmo disse no artigo “knowledge is power” – conhecimento é poder!

Obrigada Dr. Gilberto Amorim pelos esclarecimentos. Tenho recebido muitas vezes estas perguntas e agora temos a oportunidade de responde-las. Quando fui fazer o meu exame genético eu já tinha tomado a decisão sobre qual seria minha atitude. E isso deixou-me mais tranquila quando fui fazer o exame. Se você ficou com alguma dúvida, escreva abaixo, nos comentários.

Um beijo no coração,

Vânia

*Dr Gilberto Amorim – Oncologista clínico da Oncologia D’Or; Titular da Soc. Brasileira de Onologia Clínica (SBOC); Titular da American Society of Clinical Oncology (ASCO) e Membro Honorário da Soc. Brasileira de Mastologia (SBM).
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7 Comentários to “Angelina Jolie e o BRCA1 e 2 – o que fazer?”

  1. Elizabeth
    9 de abril de 2015 às 11:23

    Olá Vânia!
    A mesma dúvida pairava sobre minha cabeça desde que descobri o tri-negativo…Contudo, pelo plano de saúde, nem mesmo consegui fazer a reconstrução da mama e retirar a outra…Fui a 2 cirurgiões plásticos que se negaram a operar alegando excesso de peso! Já perdi 2x a prótese de silicone, pois a mesma abriu e a fábrica efetuou a troca. Soube que pelo SUS, somente no Hospital de Barretos fazem este exame. De qualquer forma, vou procurar novamente a ANS por conta das cirurgias restauradoras. Tem também a do abdome…
    Pra piorar minha situação, a Prefeitura do Rio, da qual sou dependente, vai cancelar o meu plano. Vou tentar fazer pelo Estado. Abração da Beth Guerreira

  2. Mariana
    4 de abril de 2015 às 23:23

    Minha dúvida não é a cerca da cirurgia preventiva, mas de vários artigos acadêmicos que tenho lido e que explicam a ação do ”Indol 3 Carbinol”. Essa ação é de ”colocar as cancerígenas para dormir” e garantir uma vida sem câncer. Como não pode ser patenteado, não movimenta a indústria farmacêutica, porém vem apresentando resultados maravilhosos e até superiores ao tamoxifeno. Ao mesmo passo que tenho lido coisas horríveis a respeito do tamoxifeno e o aumento do risco de câncer do endométrio, causado por ele, em parte das mulheres que o fazem entre 2 a 5 anos. Gostaria de saber se alguém conhece os benefícios do Indol 3 Carbinol, se alguém optou por modulação hormonal bioidêntica ao invés de seguir o protocolo pós quimioterapias e radioterapias, e se conhecem os malefícios do tamox, mesmo que tomando. Beijos a tds!!!

  3. 31 de março de 2015 às 19:58

    Dr Gilberto esclarece de modo fácil o entendimento, que bom seria poder mais pessoas (mulheres) ter acesso a entrevista. Parabéns aos envolvidos! Meu agradecimento!

  4. carmen meira
    31 de março de 2015 às 15:19

    Parabéns pelo artigo.Como sempre é bom saber a informação e com complemento de médico melhor ainda.

  5. 31 de março de 2015 às 10:53

    Parabéns pelo artigo e a participação do médico.

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